Em decorrência das medidas federais e estaduais que estabeleceram estado de calamidade pública (Decreto Legislativo n. 6/2020) e quarentena (Decreto n. 64.881, de 22 de março de 2020), além da Medida Provisória n. 927/20, que alterou medidas trabalhistas para o enfrentamento da crise, vimos surgir muitos reflexos nas relações comerciais e econômicas e, com eles, inúmeras dúvidas.
Uma delas, relativa ao pagamento decorrente dos contratos de aluguéis. Afinal, é possível renegociar e revisar os contratos de locação diante da crise?
Antes de mais nada, é importante esclarecer que não houve, até o momento, qualquer regulamentação ou alteração na legislação vigente especificamente sobre a possibilidade de suspensão dos pagamentos relativos aos contratos de locação. Assim, em princípio, não haveria impedimento legal para a cobrança dos valores estabelecidos contratualmente.
Entretanto, é plenamente cabível, de acordo com o ordenamento jurídico brasileiro, a revisão dos contratos entabulados, em razão de situações extraordinárias e imprevisíveis – o que, decerto, se aplica ao momento atual, considerando a pandemia do coronavírus e seus efeitos.
Nesse sentido, a própria da Lei do Inquilinato, em seu artigo 18, possibilita que um novo valor para o aluguel seja pactuado de comum acordo entre as partes, modificando-se a cláusula de reajuste.
Da mesma forma, os artigos 478, 479 e 480, do Código Civil, respaldam a possibilidade de renegociação nesses casos, ao tratarem especificamente sobre a “resolução por onerosidade excessiva”.
Destacamos que os referidos dispositivos legais preveem a hipótese de uma das partes pedir a resolução do contrato se a prestação tornar-se excessivamente onerosa, em virtude de acontecimentos extraordinários e imprevisíveis, bem como de se evitar a resolução, através da revisão dos termos do contrato, oferecendo-se a parte a modificar equitativamente as condições. Nesse sentido, disciplinam:
A resolução poderá ser evitada, oferecendo-se o réu a modificar equitativamente as condições do contrato.
No mesmo sentido, o artigo 317 do Código Civil também prevê a possibilidade de se revisar os contratos quando se tornarem manifestamente desproporcionais, por motivos imprevisíveis: “quando, por motivos imprevisíveis, sobrevier desproporção manifesta entre o valor da prestação devida e o do momento de sua execução, poderá o juiz corrigi-lo, a pedido da parte, de modo que assegure, quanto possível, o valor real da prestação”.
Interessante ressaltar que, muito embora seja recente a discussão, esse entendimento vem sendo adotado pelos juízes, ao decidirem sobre o tema, em pedidos liminares. Neste sentido, decisão proferida pelo Juízo da 25ª Vara Cível de Brasília/DF, que, reconhecendo a existência de “motivo imprevisível”, em razão das medidas adotadas para mitigação e supressão do COVID19, a evidenciar “manifesta desproporção entre o valor da prestação devida e o do momento de sua execução”, deferiu em parte o pedido de tutela antecipada para “suspender parte do contrato de locação entre as partes (cláusula do aluguel mínimo e do fundo de promoção e propaganda), mantendo-se em pleno vigor as demais disposições contratuais”.
Entendemos, portanto, ser plenamente cabível, dada as atuais circunstâncias, que se encaixam perfeitamente no conceito de “extraordinárias e imprevisíveis”, a renegociação contratual, a fim de se evitar, consequentemente, eventual rescisão e garantir a continuidade do contrato de locação.
*Por Amanda Lagazzi Moita
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