Barbosa Portugal Advogados

Semana passada, durante as Festividades de São João, em Campina Grande (PB), o cantor Gusttavo Lima interrompeu seu show perguntou a um espectador “quando uma pessoa é trocada pela outra, assim, sem mais nem menos, o que essa pessoa tem direito se levar na justiça? Tem direito a uma comunhão total, uma comunhão parcial de bens?”.

Sem resposta, o cantor questionou a um “advogado de família”, também na plateia: “uns 2 anos de convivência já dá uma união estável? Pode (…) levar na justiça?”. Tudo parece ser uma encenação para introduzir uma das músicas do sertanejo. Mas os questionamentos, embora colocados de maneira um pouco teatral, acabam por revelar dúvidas comuns sobre a questão: quando o namoro passa a configurar união estável?   

No clima do Dia dos Namorados, pegamos carona no vídeo do “Embaixador” para esclarecer as diferenças entre namoro e união estável. 

Afinal de contas, o fato de um casal de namorados optar por conviver dois anos debaixo do mesmo teto é suficiente para configurar uma união estável (prevista no art. 1.723 do Código Civil)? Ou podemos estar diante de uma simples relação de namoro?

A grande questão a ser esclarecida diz respeito aos elementos que caracterizam a união estável, uma vez que a redação da lei (o já mencionado art. 1.723 do Código Civil) é bastante genérica, ao estabelecer que: “é reconhecida como entidade familiar a união estável entre o homem e a mulher, configurada na convivência pública, contínua e duradoura e estabelecida com o objetivo de constituição de família”.

 Se a lei fala que essa relação há de ser travada entre “homem” e “mulher”, o STF, no julgamento da ADI 4277 e da ADPF 132, já decidiu que tal proteção legal se estende também aos casais homoafetivos. 

Esse relacionamento envolvendo dois sujeitos (não havendo, no atual cenário normativo-jurisprudencial o acolhimento das uniões poliafetivas, ou seja, entre mais de duas pessoas) há de ser público, contínuo e duradouro

Some-se a isso o fato de que a lei não fala mais (como o fazia antigamente) em tempo mínimo de relacionamento. Noutras palavras, não importa mais o tempo, mas sim a qualidade (natureza) de relação afetiva consolidada, que precisa ser publicamente séria, firme e associada ao objetivo de constituição de uma família. 

E o namoro? Bom, se a relação publicamente demonstrada entre um casal é de mero afeto, sem a existência de vínculo notório, de um claro objetivo de constituir uma família e de assumir as responsabilidades inerentes a esse vínculo – fidelidade recíproca, vida em comum, mútua assistência, respeito e considerações mútuos, dentre outros (vide deveres do casamento, dispostos no art. 1.566 do CC) –, então o caso é de mero namoro. 

Assim, para melhor se afixar no quadro mental a antiga – mas ainda atual – distinção entre namoro e união estável, trazemos o trecho de importante decisão proferida pelo Superior Tribunal de Justiça sobre o tema: “Na relação de namoro qualificado os namorados não assumem a condição de conviventes porque assim não desejam, são livres e desimpedidos, mas não tencionam naquele momento ou com aquela pessoa formar uma entidade familiar. Nem por isso vão querer se manter refugiados, já que buscam um no outro a companhia alheia para festas e viagens, acabam até conhecendo um a família do outro, posando para fotografias em festas, pernoitando um na casa do outro com frequência, ou seja, mantêm verdadeira convivência amorosa, porém, sem objetivo de constituir família” (STJ, REsp 1.263.015/RN, 3ª Turma, Rel. Min Nancy Andrighi, julgado em 19/6/2012, DJe 26/6/2012).

Questão final que surge, porém, é se existe alguma providência que os casais possam tomar para deixar clara a condição em que (con)vivem. 

A resposta é sim. Aos que queiram assegurar que a relação não passa de simples namoro, é possível a celebração de um “contrato de namoro”; porém, se o que o casal pretende mesmo é constituir uma família, atraindo para si os direitos e deveres indissociáveis da figura da união estável, então o caminho mais indicado é a lavratura de uma escritura pública de união estável, perante qualquer Cartório de Notas.

Porém, vale o alerta: para a Justiça, embora relevantes tais documentos, o que irá definir a natureza da relação, efetivamente, serão as provas, tanto do simples namoro (e da inexistência do objetivo claro de constituir uma família), quanto da vontade do casal de ser uma família (com a divisão de despesas, responsabilidades, com o estabelecimento ou não de residência comum, com a criação de filhos comuns, etc.), apta, nesse último caso, a configurar a união estável; afinal de contas, como diz, com sabedoria, o ditado popular, “o papel aceita tudo”.

Por Bruno Reis Pinto

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