Tribunais de Justiça de São Paulo e do Ceará proferiram duas recentes decisões para assegurar que o valor utilizado por sócio na integralização de capital de qualquer tipo de empresa, ainda que desempenhe atividade preponderantemente imobiliária, não será objeto de cobrança de ITBI, salvo se o valor do bem imóvel exceder o valor do capital.
No final de 2020, o Supremo Tribunal Federal julgou e decidiu que a imunidade tributária do Imposto sobre Transmissão de Bens Imóveis (ITBI) não alcança o valor dos bens imóveis incorporados ao patrimônio de pessoa jurídica que exceder o limite do capital social a ser integralizado.
No julgamento do Tema 796, que teve como leading case o Recurso Extraordinário nº 796.376/SC, prevaleceu o voto do ministro Alexandre de Moraes, que adotou o entendimento de que a ressalva apontada na segunda parte do inciso I do §2º do artigo 156 da Constituição Federal, envolvendo o setor imobiliário, refere-se exclusivamente à transmissão de bens ou direitos em casos de fusão, incorporação, cisão ou extinção de pessoa jurídica.
Art. 156. Compete aos Municípios instituir impostos sobre:
(….)
II – transmissão “inter vivos”, a qualquer título, por ato oneroso, de bens imóveis, por natureza ou acessão física, e de direitos reais sobre imóveis, exceto os de garantia, bem como cessão de direitos a sua aquisição;
I – não incide sobre a transmissão de bens ou direitos incorporados ao patrimônio de pessoa jurídica em realização de capital, nem sobre a transmissão de bens ou direitos decorrente de fusão, incorporação, cisão ou extinção de pessoa jurídica, salvo se, nesses casos, a atividade preponderante do adquirente for a compra e venda desses bens ou direitos, locação de bens imóveis ou arrendamento mercantil;
Para melhor compreensão, a fixar sua tese vencedora sobre o Tema 796, o Ministro Alexandre de Moraes dividiu o texto constitucional em duas situações: (I) a transmissão de bens ou direitos incorporados ao patrimônio de pessoa jurídica para a integralização de capital; (II) transmissão de bens ou direitos decorrentes de fusão, incorporação, cisão ou extinção de pessoa jurídica.
“Em outras palavras, a segunda oração contida no inciso I – “nem sobre a transmissão de bens ou direitos decorrente de fusão, incorporação, cisão ou extinção de pessoa jurídica, salvo se, nesses casos, a atividade preponderante do adquirente for a compra e venda desses bens ou direitos, locação de bens imóveis ou arrendamento mercantil” – revela uma imunidade condicionada à não exploração, pela adquirente, de forma preponderante, da atividade de compra e venda de imóveis, de locação de imóveis ou de arrendamento mercantil. Isso fica muito claro quando se observa que a expressão “nesses casos” não alcança o “outro caso” referido na primeira oração do inciso I, do § 2º, do art. 156 da CF.
(….)
Ou seja, a exceção prevista na parte final do inciso I, do § 2º, do art. 156 da CF/88 nada tem a ver com a imunidade referida na primeira parte desse inciso. Assim, o argumento no sentido de que incide a imunidade em relação ao ITBI, sobre o valor dos bens incorporados ao patrimônio de pessoa jurídica, em realização de capital, excedente ao valor do capital subscrito, não encontra amparo no inciso I, do § 2º, do art. 156 da CF/88, pois a ressalva sequer tem relação com a hipótese de integralização de capital. Reitere-se, as hipóteses excepcionais ali inscritas não aludem à imunidade prevista na primeira parte do dispositivo. Esta é incondicionada, desde que, por óbvio, refira-se à conferência de bens para integralizar capital subscrito.”
A interpretação adotada pelo ministro gera a leitura de que a imunidade tributária do ITBI para a transferência de bens na integralização do capital social vale também para o contribuinte cuja atividade preponderante for a compra e venda desses bens ou direitos, locação de bens imóveis ou arrendamento mercantil.
Com base nesse entendimento, os Tribunais de Justiça de São Paulo e do Ceará proferiram duas recentes decisões para assegurar a imunidade do ITBI realização de capital social em pessoas jurídicas que têm a atuação no setor imobiliário como atividade preponderante.
O Tribunal de Justiça de São Paulo, analisando caso de empresa cujo capital social de R$ 7.756.641,89 foi totalmente integralizado pela transferência de um único imóvel, posteriormente vendido, entendeu ser o caso de rever a jurisprudência até então dominante, aplicando o novo entendimento adotado pelo Supremo Tribunal Federal.
Nos termos do voto do Desembargador Kleber Leyser de Aquino:
“Entendo que a parte final do artigo 156, parágrafo 2º, inciso I, da Constituição Federal, refere-se apenas à transmissão de bens ou direitos decorrente de fusão, incorporação, cisão ou extinção de pessoa jurídica, excluída a hipótese de integralização de capital social”.
No Tribunal de Justiça do Ceará, o Desembargador Fernando Luiz Ximenes Rocha, destacou que a nova orientação do Supremo Tribunal Federal é, de fato, contrária à jurisprudência até então adotada nos tribunais brasileiros:
“Consoante entendimento acima indicado, o valor utilizado por sócio na integralização de capital de qualquer tipo de empresa, ainda que desempenhe atividade preponderantemente imobiliária, não será objeto de cobrança de ITBI, salvo se o valor do bem imóvel exceder o valor do capital”.
Trata-se de dois importantes precedentes para as empresas do setor imobiliário, possibilitando a discussão sobre eventual cobrança de ITBI no futuro, em relação a imóveis utilizados para integralização do capital social.
Ainda com dúvidas sobre o assunto? Nosso time de advogados especialistas em Direito Tributário está pronto para ajudar.
Por Jonas Pereira Fanton e Fábio Augusto Nogueira