No dia 22 de março de 2023, a startup de moda AMARO, criada pelos suíços Dominique Oliver e Lodovico Brioschi, pediu à Justiça de São Paulo a homologação de seu plano de recuperação extrajudicial.
A empresa, que possui forte atuação no e-commerce e marca presença em centros de compras através de suas “Guide Shops”, acumula uma dívida de R$ 244,5 milhões.
Nos últimos anos, o mercado brasileiro varejista de roupas tem sofrido com a concorrência das plataformas asiáticas, como a SHEIN, Shopee e Aliexpress.
De acordo com a legislação brasileira, a tributação base na importação de produtos é de 60% do valor das remessas de US$ 3 mil até US$ 10 mil, quando realizada pelo consumidor (pessoa física). Contudo, as plataformas chinesas de e-commerce tentam burlar essa tributação (imposto de importação de 60%) utilizando-se da isenção para as compras realizadas entre pessoas físicas (no Brasil e no exterior) e cujo valor da remessa é de até US$ 50 (já com frete e seguro).
Assim, o que muitos consumidores fazem – inclusive sob orientação das plataformas estrangeiras – é realizar diversas compras, usando o limite de isenção (até US$ 50 dólares), declarando a compra entre pessoas físicas (quando, na verdade, o produto está sendo enviado por pessoa jurídica e comprado por pessoa física) e evitando, assim, qualquer tributação incidente nas roupas adquiridas no exterior.
Em contrapartida, as empresas varejistas brasileiras sofrem com a alta carga tributária do setor, que chega a 35%.
Por isso, a falta de isonomia na tributação pode ser uma das causas da recente notícia da recuperação extrajudicial da Amaro. E para evitar que o setor de vestuário sofresse mais prejuízos, o Governo Federal ensaiou um cerco contra as plataformas, cogitando a edição de medida provisória para acabar com a isenção, inclusive. Porém, diante da repercussão negativa, o Ministério da Fazenda recuou e abandonou a ideia, mantendo-se, por enquanto, a situação de desequilíbrio entre as plataformas nacionais e estrangeiras de e-commerce.
Como uma alternativa à recuperação financeira de empresas e para preservação da atividade empresarial, a recuperação extrajudicial possui um rito consideravelmente mais curto e simplificado do que a recuperação judicial, pois não é necessário que a negociação seja acompanhada pela Justiça.
O devedor convoca seus credores para fazer uma negociação coletiva, em que são definidos todos os direitos, condições de pagamento e obrigações. O documento é elaborado, depois assinado pelo devedor e por todos os credores e, então, submetido ao juiz para homologação.
Alguns tipos de pessoas jurídicas são proibidos de pedir a recuperação extrajudicial pela Lei 11.101/2005. São eles: sociedades simples, seguradoras, sociedades de capitalização, instituições financeiras, cooperativas de crédito, consórcios e operadoras de planos de assistência à saúde.
Para propor e negociar com seus credores um plano de recuperação extrajudicial, o devedor deve, ainda, atender aos seguintes requisitos:
Em relação aos créditos sujeitos à recuperação, existem limitações: dívidas tributárias, por exemplo, não são abrangidas. As dívidas trabalhistas, por sua vez, somente poderão ser incluídas no plano de recuperação mediante negociação com o sindicato.
Os credores titulares de créditos não sujeitos à recuperação extrajudicial não podem ser obrigados por lei a se vincular ao acordo proposto pelo devedor, mas podem optar por fazê-lo voluntariamente.
Em regra, as condições do plano de recuperação extrajudicial podem ser negociadas livremente entre o devedor e seus credores. No entanto, a Lei 11.101/05 estabelece algumas regras, dentre elas:
– o plano não pode estabelecer o pagamento antecipado de dívidas nem estabelecer tratamento desfavorável aos credores não sujeitos a ele;
– o plano de recuperação extrajudicial pode prever a alteração de valores e forma de pagamento a seus signatários com efeitos antecipados. Ou seja, pode estabelecer pagamento aos credores antes mesmo da homologação do plano pelo juiz. No entanto, caso a homologação seja indeferida, os credores voltam a ter o direito de exigir seus créditos nas condições originais, devendo abater o que eventualmente tiverem recebido.
A aprovação das condições propostas por 100% dos credores desobriga o devedor de solicitar a homologação. O plano, nesse caso, serve como um contrato. A critério do credor, no entanto, a homologação pode ser solicitada.
Caso não haja unanimidade na aprovação, o juiz pode homologar o plano de recuperação extrajudicial, hipótese em que todos os credores que se sujeitam à recuperação serão abrangidos, mesmo aqueles que tenham votado contrariamente às condições apresentadas.
Para isso, é necessário que o plano tenha sido assinado por credores que representem mais da metade dos créditos de cada espécie abrangidos pelo plano de recuperação extrajudicial.
Homologado, o plano de recuperação extrajudicial passa a ser um título executivo judicial e pode ser executado em juízo pelo credor.
Por Fernanda Riqueto Gambareli Spinola e Vanessa Ribeiro Pereira Moda.